Imagine o seguinte cenário: eu moro em um apartamento e estou percebendo sinais de infiltração na minha laje. O problema é que a infiltração está vindo do apartamento do vizinho. Será que é possível impermeabilizar a laje por baixo e resolver o problema?
Esta é uma situação bastante comum em vários apartamentos em todo o território nacional.
E, quase sempre envolvem outros problemas como ter que lidar com o vizinho ou discussão com a administração do condomínio ou construtora sobre quem deve ser o responsável pelo prejuízo.
A resposta à pergunta é: não é recomendado impermeabilizar a laje por baixo.
E neste texto vamos explicar o porquê esta não é uma solução, passando pelos detalhes e explicações técnicas, e também explicar quais são as melhores práticas para resolver problemas de infiltração da laje advindas do pavimento superior.
Primeiro passo: Identificar a origem da infiltração
Os sinais clássicos de infiltração em lajes e problemas de impermeabilização são bastante conhecidos: mofo, manchas, descascamento da pintura, bolor, mau-cheiro, goteiras.
Além de sinais que não são facilmente visíveis, mas podem estar acontecendo, como por exemplo a exposição da armadura do concreto, carbonatação, lixiviação e fissuras.
Entenda:
Como sempre comentamos aqui neste blog, os elementos estruturais de concreto armado são capazes de garantir a estanqueidade, contudo, não são materiais impermeáveis. É necessária, portanto, a execução de algum tipo de sistema de impermeabilização, conforme a especificidade de cada peça.
Está tendo problemas com o vizinho? Estes posts podem ajudar:
- Vizinho não quer consertar vazamento, e agora?
- Quero consertar a infiltração mas o vizinho não concorda, e agora?
Neste sentido, quando há sinais de infiltração de água em uma laje, é preciso identificar se:
1. A infiltração é decorrente de falhas de impermeabilização na laje
A manta asfáltica que é utilizada na impermeabilização de lajes tem uma vida útil de, em média, 5 a 10 anos, se aplicada corretamente.
Isso significa que eventualmente o sistema de impermeabilização precisa passar por uma manutenção.
Como a manta não pode ficar exposta, este tipo de patologia só é resolvido retirando todo o piso, cobertura e refazendo a manta asfáltica.
2. A infiltração é decorrente de vazamentos dos sistemas hidrossanitários
Outro problema comum é quando algum tipo de tubulação e conexão (caixa sifonada, tubulação de água fria ou tubos de queda, joelhos, curvas, etc.) apresenta algum tipo de vazamento.
Nas edificações mais modernas, as tubulações são instaladas de maneira visitável, isto é, com um acesso mais fácil, sem a necessidade de quebrar a estrutura de concreto para reparos, como nos casos de forros rebaixados de gesso.
Nestes casos, os sinais de infiltração aparecem ocorrem nas placas de gesso, e não necessariamente na laje, e ocorrem mais frequentemente em áreas molhadas (banheiros e cozinhas).
Pressão hidrostática positiva x Pressão hidrostática negativa
Um conceito muito importante para ser entendido é de pressão de água (hidrostática) positiva e negativa.
Entender este conceito é fundamental para escolher corretamente o tipo de sistema de impermeabilização e as técnicas que serão aplicadas, de maneira a garantir um serviço seguro e de longo prazo.
A água pode exercer, basicamente, dois tipos de esforços nos elementos estruturais.
Quando a água exerce pressão no sentido da impermeabilização, ela é denominada PRESSÃO HIDROSTÁTICA POSITIVA.
A pressão positiva pode ser entendida como aquela que “empurra” a estrutura de dentro para fora, ou de cima para baixo.
Como por exemplo:
- a água da chuva em cima de uma laje;
- a água dentro de um reservatório “empurrando” das paredes laterais pelo lado de dentro;
- a água da piscina empurrando a estrutura ao seu redor.
De acordo com a NBR 9575 – Impermeabilização Seleção e Projeto:
Água sob pressão positiva: água, confinada ou não, que exerce pressão hidrostática superior a 1 kPa (0,1 m.c.a), de forma direta à impermeabilização
Esse tipo de pressão hidrostática requer atenção e a aplicação de um sistema de impermeabilização adequado, pois é a que está em atuação direta sobre a estrutura.
Quando a água exerce pressão no sentido oposto da impermeabilização, ela é denominada PRESSÃO HIDROSTÁTICA NEGATIVA.
A pressão negativa pode ser entendida como aquela que “empurra” a estrutura de fora para dentro, ou de baixo para cima.
A pressão negativa ocorre na face oposta da impermeabilização. Como exemplo:
- A pressão da água do solo empurrando as paredes da piscina de fora para para dentro;
- A pressão da água em um na face do muro de arrimo que não recebeu impermeabilização;
- A água que percola e empurra a face inferior da laje;
- A água que infiltra de maneira ascendente nas vigas baldrames.
De acordo com a NBR 9575 – Impermeabilização Seleção e Projeto:
Água sob pressão negativa: água, confinada ou não, que exerce pressão hidrostática superior a 1 kPa (0,1 m.c.a), de forma inversa à impermeabilização
Por que não é recomendado impermeabilizar uma laje por baixo?
Como sabemos, a laje é um elemento estrutural que forma, juntamente com vigas, pilares e fundação, o sistema estrutural da edificação.
Dessa forma, a laje é dimensionada para suportar os esforços solicitantes, e por isso é composta de concreto e da armadura de aço, também conhecida como ferragem.
Uma das funções principais da impermeabilização é garantir que o concreto permaneça íntegro, e assim, a armadura de aço não seja exposta e sofra corrosão.
Este tipo de patologia, se não identificado e corrigido, pode levar à falhas de resistência, surgimento de fissuras, e até, em casos extremos, à ruptura.
Por essa razão, a laje deve estar protegida em relação às pressões hidrostáticas positivas, que neste caso será a água que estiver em contato direto para a face superior da laje, como no caso da água da chuva, empoçamento, ou água utilizada para limpeza, por exemplo.
Fazer uma impermeabilização na face inferior da laje, ou àquela que não está em contato direto com água, é, portanto, um contrassenso, basicamente porque:
- Não há, neste caso, pressão positiva na face inferior da laje. Em outras palavras, não há como a água fazer pressão de baixo para cima, em sentido contrário à própria gravidade.
- Impermeabilizar a face inferior seria uma forma de se proteger contra pressão hidrostática negativa, o que também não faz sentido. Imaginando que para sofrer uma pressão negativa, a água teria que percolar por toda espessura da laje, sendo este um risco gravíssimo para estabilidade estrutural da laje.
Dessa forma, é possível concluir que a melhor prática é, primeiramente, entrar em contato com engenheiros e empresas especializadas em impermeabilização, para, primeiramente, identificar as origens das infiltrações e assim montar um plano de ação para os reparos necessários, sempre seguindo as orientações normativas.
Estes planos, na maioria das vezes, envolvem a substituição da impermeabilização para que as infiltrações cessem de maneira definitiva.